• Urge repudiar e combater a violência política

    1240 Jornal A Bigorna 03/09/2022 16:40:00

    Pelas investigações que vieram a público até o momento, tudo leva a crer que a tentativa de assassinato da vice-presidente da Argentina, Cristina Kirchner, tenha sido ato isolado de um brasileiro radicado em Buenos Aires, que nutria simpatias por ideologias de extrema direita. Felizmente, ela sobreviveu ilesa. Mas isso não significa que o atentado não tenha surtido efeito. Numa sociedade polarizada como a argentina, atos dessa magnitude contribuem para acirrar os ânimos.

    Foi o que se viu nas manifestações que tomaram as ruas de Buenos Aires e na reação da classe política — sobretudo dos peronistas, preocupados em tirar proveito do ataque atribuindo a responsabilidade aos adversários ideológicos, à imprensa e a outros bodes expiatórios, e não ao autor do crime. É uma atitude que só agrava o clima de ódio e aumenta o risco de novos atos violentos.

    A preocupação com a violência política não se restringe à Argentina. Como argumenta o colunista do GLOBO Pablo Ortellado, ela precisa se estender a toda sociedade com polarização crescente. É o caso do Brasil, que também foi palco recente de atentados de motivação política. Felizmente também foram atos isolados, segundo as autoridades, o ataque ao presidente Jair Bolsonaro em Juiz de Fora na campanha de 2018 e o assassinato de um tesoureiro petista em Foz do Iguaçu neste ano. Mas é preciso fazer o possível para que tais episódios não evoluam para a violência organizada.

    É certo que não há guerrilhas nem organizações terroristas em operação no território nacional. O país enfrenta, porém, vários grupos armados com interesses políticos nítidos, como as facções criminosas que operam nos presídios ou as milícias cariocas, sobre as quais recai a suspeita de envolvimento no assassinato da vereadora Marielle Franco e de seu motorista em 2018 (cujos mandantes até hoje não foram descobertos).

    Parece evidente, também, que o incentivo ao armamento da população pelo governo Bolsonaro amplia o risco de confrontos violentos. Divergências políticas que outrora se restringiam a discussões inconsequentes de botequim têm com frequência evoluído para vias de fato, fraturando famílias, grupos de amigos e colegas de trabalho. A situação chegou a tal ponto que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) teve de proibir o porte de armas nos locais de votação, para evitar o pior.

    Toda violência precisa ser repudiada, não importa de onde venha. O que distingue a civilização da barbárie é a resolução pacífica dos conflitos. É fundamental, sobretudo, que os políticos tenham a sabedoria de não transformar seus adversários (que desejam derrotar) em inimigos (que gostariam de eliminar), de não substituir a rivalidade saudável (intrínseca a qualquer competição) pelo ódio cego e irracional (que nada traz de bom). É um recado que vale para os peronistas e oposicionistas argentinos, para os trumpistas e democratas americanos, para os petistas e bolsonaristas brasileiros — e para qualquer outro grupo político.(Do Globo)

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