Publicações que associem "doenças mentais" a identidade de gênero ou orientação sexual vão passar a ser permitidas nas redes sociais da Meta a partir desta terça-feira. A mudança é parte das novas Diretrizes da Comunidade da empresa, documento que define conteúdos que são proibidos nas plataformas do grupo como o Instagram, o Facebook e o Threads.
As mudanças são válidas para todos os países onde as redes sociais operam, segundo a empresa informou ao GLOBO. A nova versão atualiza as regras de fevereiro do ano passado e altera especialmente regras sobre gênero.
Mais cedo, Mark Zuckerberg, fundador e CEO da empresa, anunciou medidas que mudam as regras da Meta para combater desinformação e ódio. O fim dos checadores independentes e a flexibilização nos filtros para retirada de postagens foram algumas das principais decisões.
Para especialistas, a alteração abre caminho para discursos de ódio. No Brasil, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, em 2023, que atos ofensivos praticados contra pessoas da comunidade LGBTQIAPN+ podem ser enquadrados como injúria racial. Em 2019, a Corte já havia determinado o enquadramento da homotransfobia no tipo penal definido na Lei do Racismo.
Na nova versão das diretrizes, a empresa afirma que irá permitir “acusações de anormalidade mental relacionadas a gênero ou orientação sexual, especialmente quando discutidas no contexto de debates religiosos ou políticos, como questões de 'transgenderismo' e homossexualidade". "Esses debates são considerados amplamente culturais e políticos”, acrescenta a companhia. Na prática, a empresa irá permitir que pessoas transsexuais, gays ou bi sejam associadas à transtornos mentais.
A Meta também passou a permitir publicações que associem limitações de gênero para determinadas funções. O texto diz que a empresa irá permitir “conteúdo que defenda limitações de gênero em empregos militares, policiais e de ensino”.
A mesma permissão irá valer para quem alegar limitações baseada na orientação sexual, quando o conteúdo for “baseado em crenças religiosas”. Isso significa que os usuários poderão defender que mulheres não têm competência para cumprir o serviço militar, por exemplo, ou que pessoas trans não podem exercer a profissão de professoras.
A nova política também irá permitir discussões sobre exclusão baseadas em sexo ou gênero em uma variedade maior de contextos (banheiros, escolas específicas, papéis no exército, aplicação da lei ou ensino), ampliando o que antes era restrito apenas a grupos de saúde ou apoio.
A empresa diz haverá espaço para esses tipos de discurso, quando as pessoas indicarem “claramente sua intenção”. Onde a intenção não estiver clara, poderemos remover o conteúdo”, afirma.
Outra restrição completamente eliminada da nova política é a que proibia alegações de que determinados grupos (seja por raça, etnia ou gênero) espalhavam o coronavírus. Na prática, será permitido associar os chineses, por exemplo, a disseminação do vírus da Covid-19.
A versão atual da política da Meta ainda proíbe conteúdos considerados graves, como discursos desumanizantes que comparam pessoas a animais ou patógenos e estereótipos prejudiciais ligados à violência, incluindo negação do Holocausto.
Também permanecem proibidos insultos relacionados à aparência física, capacidade mental e caráter, além do uso de calúnias que neguem a existência de grupos protegidos ou façam deboche de vítimas de crimes de ódio. Essas práticas são categorizadas como ataques diretos e continuam sendo moderadas com mais rigor.
A mudança na postura da Meta em relação a restrição de conteúdos marca o alinhamento da empresa com o novo governo americano, avalia Andréa Janer, CEO da Oxygen. Ela lembra que Donald Trump, assim como seu aliado político, Elon Musk, são críticos do que chamam de "agenda woke", termo usado pela extrema direita para pautas relacionadas à igualdade racial, social e de gênero:
— Os anúncios de hoje indicam que Mark Zuckerberg passou a estar assustadoramente alinhado com o X, de Elon Musk. Isso tudo tem uma agenda política por trás, com uma influência fortíssima da eleição de Donald Trump, que tem se aproximado com o universo da tecnologia desde que indicou o vice, JD Vance.
O professor de Marketing Digital da ESPM, João Finamor, concorda que há um movimento de adequação da Meta aos posicionamentos de Donald Trump. A expectativa dele é que as redes sociais da companhia passem a ser mais “tolerantes” com conteúdo radicalizados, assim como tem acontecido no X.(Do Globo)