O cansaço nos olhos não impediram Mercês Camila de Moura Alvarenga, moradora de Cerqueira César (SP), de ir em busca dos sonhos. Aos 94 anos, ela passou a fazer parte de um projeto de alfabetização para a terceira idade.
Dona Mercês não é a única a superar as barreiras do tempo. Além dela, a iniciativa criada pela Associação Cerqueirense da Vital (Acervi), outras sete pessoas com mais de 60 anos formam a 'Turminha da Melhor Idade'.
"Costurei na maior parte da vida e ainda costuro, mas quando vim morar pra cá, minha filha falou da escolinha e que seria bom eu aprender pelo menos o meu nome. Ela tá certa (...) Pra mim, é uma diversão! Eu amo todo mundo daqui de coração. Tenho um carinho pelos meus colegas e por essas mulheres que me ajudam", disse a idosa, que conquistou a certidão de nascimento aos 12 anos, juntamente aos outros irmãos.
Dona Mercês explicou que a falta de acessibilidade e condições a "arrastaram" para longe dos estudos. Apesar disso, ela nunca desestimulou os 10 filhos - todos alfabetizados e empregados. Para a aposentada, um motivo de orgulho e alívio, ao considerar que eles não passaram por situações constrangedoras já vividas por ela.
"As coisas eram bem diferentes. Quando me mudei pra cá, vindo de carro de boi, nem sabia falar direito. Isso nunca me impediu de trabalhar. Trabalhei muito para os meus filhos estudarem (...) Quando ia pegar um ônibus, pra não incomodar ou pegar errado, eu copiava em um papel. O pessoal até admirava. Eu, sem saber escrever, andando com papel e caneta na bolsa", lembrou a idosa.
Seja pela falta de oportunidade ou por priorizar a educação dos filhos, o número de pessoas não alfabetizadas no Brasil ainda é grande. De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD), compilados pelo Serviço Social da Indústria (Sesi), mais de 10 milhões de brasileiros, com 15 anos ou mais, não sabem ler e escrever.
Já na microrregião de Avaré (SP), à qual pertence Cerqueira César, 107.241 adultos não possuem instrução ou não concluíram o ensino fundamental, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE).
De acordo com Juliana Ranes Tizei Espinhara, uma das professoras da "Turminha da Terceira Idade", apesar do governo dedicar mais tempo à educação de crianças e jovens, a alfabetização básica de idosos também é uma questão de segurança pública. Para ela, a falta de conhecimento torna esse público alvo de golpistas.
"É preciso mostrar que dá tempo de aprender aos 20, 30 anos e até aos 60 anos. Hoje, com a tecnologia, se passa ainda mais apuro sem saber ler e escrever. Por exemplo, num caixa eletrônico, elas podem acabar virando presas de quem tem má fé. Também afeta tarefas simples, por exemplo, ao ir ao mercado", explicou a professora, que é especializada em alfabetização.(Do G-1)