
Além de prender os ladrões, combater os roubos em São Paulo exige mapear a estrutura por trás dos crimes na rua. Uma das frentes está nas “redes de logística”, que emprestam armas de fogo, capacetes e até bags (mochilas) para os bandidos se disfarçarem de entregadores de aplicativo. Outra demanda é identificar os receptadores, focados em fazer transferências por aplicativos bancários ou dar destinação rápida aos celulares roubados.
As investigações apontam também para uma atuação crescente de assaltantes “de ofício”, que circulam a cidade de moto atrás das vítimas, no lugar do crime de oportunidade, em que o ladrão agia apenas se identificasse um potencial alvo distraído.
“Ele (o criminoso) encara essa atividade de roubar como um ofício. Ele sai de manhã, vai praticar roubo e volta para almoçar no meio da tarde”, diz o delegado Clemente Calvo Castilhone Junior, chefe da Divisão de Investigações sobre Crimes contra o Patrimônio do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) da Polícia Civil.
Em entrevista ao Estadão, ele aponta dois caminhos: o primeiro é tratar os roubos, principalmente os que evoluem para latrocínio, com olhar mais sistêmico. “A gente tenta saber a cadeia logística: quem vende essa arma, para onde vão os bens subtraídos”, afirma.
O segundo é dar resposta rápida e reunir um conjunto probatório robusto para a condenação dos responsáveis, sobretudo nos casos de latrocínio. “A população é diariamente exposta a imagens de violência, o que contribui significativamente para o aumento da sensação de insegurança. No entanto, é importante destacar que muitos dos autores desses crimes estão sendo identificados e presos graças ao trabalho investigativo”, diz.
Pesquisa recente da Quaest aponta que a violência é a principal preocupação dos brasileiros. No último ano, o número de roubos até caiu no Estado – menor patamar da série histórica. Mas especialistas apontam que, pela possibilidade de transferências pelo Pix, o prejuízo ao ter um aparelho roubado passou a ser maior do que antes.
Outro problema tem sido a escalada de crimes violentos, como a morte do ciclista Vitor Medrado, baleado perto do Parque do Povo, na zona oeste, ou do arquiteto Jefferson Dias, assassinado após intervir em um assalto no Butantã, também na zona oeste.
A sensação de impunidade também piora o cenário. “Não é raro nos depararmos com indivíduos que já praticaram e respondem por 10, 15 ou até mais roubos, e ainda assim continuam em liberdade, voltando a cometer novos delitos”, afirma Castilhone Junior
“O caso do ciclista é um exemplo trágico. O autor do disparo que o vitimou cometeu o latrocínio pela manhã e, pouco tempo depois – apenas trocando o comparsa que pilotava a moto –, fez nova vítima, contra a qual também disparou sua arma”, continua.
Para ele, também é necessário reduzir as possibilidades de progressão de pena para crimes violentos. “A simples ideia de que podem voltar às ruas em pouco tempo, mesmo após tirarem uma vida, enfraquece o poder dissuasório da punição.”
O Deic prendeu os dois suspeitos por envolvimento direto no latrocínio de Medrado, além de uma possível financiadora da dupla, a “Mainha do Crime”. Segundo as investigações, ela fornecia apoio logístico para que diferentes grupos saíssem de Paraisópolis, na zona sul, para roubar em regiões próximas. As defesas do trio não foram localizadas.
Há mais de 30 anos na polícia, Castilhone Junior assumiu a divisão do Deic focada em combater crimes patrimoniais no começo do ano. A unidade comandada por compreende seis delegacias, inclusive a focada no esclarecimento de latrocínios, que subiram 23% na capital em 2024.(Do Estado de SP)