CINE SANTA CRUZ
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José Carlos Santos Peres
“tudo em ti foi naufrágio”
Pablo Neruda
Naquele tempo conduzias com os dedos
à flor da pele o percurso de um rio
enquanto buscavas às margens
a lâmina de uma carícia;
suspiravas como a mocinha
do filme deixando-se em frestas:
rendas alfinetes botões
débora kerr
Hoje diz com enfado coisas inusitadas
como o jantar está na mesa
ou a borboleta roçou a cortina,
atropelando horas e novelas
quando a impaciência da noite
afia nossas velhas garras...
Naquele tempo dizias do paraíso
que habitavas quando o drops Dulcora
unia e atiçava nossas línguas,
num tempo de céu argênteo
iluminando a prata dos teus olhos
entre becos suspiros muros caiados
perfume de alfazema e batom carmesim
Hoje, da varanda do que somos
a vida é um rio que se desmancha
E nosso filme
um roteiro que não se fez.