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    Contos do Zé #16 - Colecionador de Playboys

    1554 Jornal A Bigorna 05/05/2020 11:00:00

    Palanque do Zé

    Anderson era o dono do Sebo Avenida, que ficava no Centro da cidade de Vila Verde. Como sendo o único a atuar no ramo em toda a região, acabava se beneficiando um pouco. Tanto ao salgar os preços quanto ao conseguir comprar raridades.

    Foi a internet que prejudicou muito os sebos e bancas de jornal. Por que comprar um livro ou jornal se as pessoas podem ter tudo isso em seus tablets? E o pior: Na hora! Isso só era ruim para os donos de banca e sebos, é claro.

    Bom, a verdade é que muita gente ainda prefere ter os livros e jornais nas mãos, para poder sentir o cheiro e textura do papel. Mas essas pessoas são cada vez mais raras.

    É por isso que Anderson fechou o Sebo após vários anos de bons serviços prestados à cultura de Vila Verde. Ao menos três gerações se beneficiaram com o conhecimento que o seu trabalho lhes proporcionou.

    Uma vez disseram que ele merecia uma Moção de Aplausos da Câmara Municipal, pois havia feito muito mais pela Cultura da cidade, do que qualquer Secretário de Cultura que já tenha passado por lá.

    Mas havia uma única coisa que impedia Anderson de fechar o Sebo. E não se tratava de amor ao negócio ou medo de não conseguir se sustentar após baixar definitivamente as portas, já que era aposentado e, para ser sincero, não esperava gastar todas as suas economias antes de morrer, já que tinha 83 anos e, nas suas próprias palavras, “estava fazendo hora extra no trabalho que era viver”.

    O que o paralisava era o medo de, ao fechar as portas, ficar sem acesso aos Acumuladores e Colecionadores que vez por outra se viam obrigados a desfazerem-se de suas coleções (ou lixos, depende do ponto de vista) em sua loja, e ele jamais conseguir completar a coleção de Playboys que mantinha havia anos… Só lhe faltava a de número 89, que foi lançada em dezembro de 1982 e trazia a apresentadora Xuxa Meneghel na capa.

    Certa vez ele vendeu seu carro e foi até o Rio de Janeiro, em uma galeria do bairro Botafogo, zona sul da cidade, para participar de um leilão onde a referida peça foi arrematada por inacreditáveis R$ 60 mil. E ele não teve nem chance de dar o primeiro lance, com apenas 12 mil que havia conseguido vendendo seu automóvel.

    Tal preço elevado, gostava de explicar para qualquer um que mostrasse o mínimo interesse no assunto, se devia ao fato de boa parte da referida edição ter sido misteriosamente recolhida dos sebos e lojas especializadas. Anderson ainda dizia acreditar que isso foi feito a pedido da própria Xuxa, quando ela passou a ser a “Rainha dos Baixinhos” na TV Globo.

    E, sim, Anderson sabia que essa mesma revista, em bom estado, podia ser encontrada na internet por cerca de R$ 230,00 nos últimos tempos. Mas jamais a compraria assim, pois estaria se rendendo ao inimigo contra o qual lutou durante tantos anos.

    E, ademais, fazer isso tiraria toda a graça da coisa, que estava justamente na busca. Ele, por exemplo, jamais teria ido ao Rio se não fosse pela revista.

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    TRÊS MESES DEPOIS

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    Percebendo que o Avô não desistiria de buscar a revista que completaria sua coleção antes de se aposentar, Robson, o neto mais velho de Anderson, a comprou pela internet e lhe presenteou no Natal de 2017, ano em que a versão brasileira da marca deixou de existir oficialmente.

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    SETE MESES DEPOIS

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    Anderson faleceu em sua casa, rodeado por suas Playboys, como sempre desejou. Costumava dizer, desde que conseguiu a última edição faltante que, ao longo de sua vida, tinha gasto o preço de “uma boa casa” com sua coleção. Também dizia que não se arrependia de nada e que faria tudo outra vez.

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    DOIS ANOS DEPOIS

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    Com o fim do Inventário dos bens deixados por Anderson, seus herdeiros decidiram vender a Coleção. Ela contava com 460 edições numeradas a partir do número 36, que datava de julho de 1978, quando a revista “Homem” passou a se chamar “Playboy”, até a de número 497, de dezembro de 2017. Isso sem contar com mais 13 edições especiais e 4 CD-ROMs, sendo um deles, da Tiazinha.

    Um sujeito do Amapá adquiriu o lote todo por meio do Mercado Livre, pagando R$ 11.000,00 mais R$ 44,90 de frete.

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