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    Conto: Tango apaixonado e desencantado

    Episódio 2

    2535 Jornal A Bigorna 18/01/2018 11:02:00

    Desde que saí daquele belo hospital gerido pelo SUS depois de levar uns sopapos dos catadores de reciclagem, onde mamãe teve até que comprar remédios que o Hospital não possuía, não parei mais de pensar naquela enfermeira que conheci à primeira vista.

    Recuperei-me depois de alguns dias e voltei a trabalhar, no entanto minha alma ardia em chamas do clamor do amor. Atendi dois clientes que precisavam só de uma consulta. Sou um profissional respeitado e cobro pelas consultas. Recebi dois cheques. Na hora do almoço fui ao banco para sacá-los. O moço do Caixa do Banco olhou os cheques e me pediu para esperar. Não demorou muito veio até mim um senhor alto de cabelos grisalhos. Sou importante, até o gerente me dá atenção.

    O gerente me chamou a sua mesa. Ao me sentar ele mostrou as duas folhas de cheque e perguntou quem havia me passado. Expliquei tudo a ele, mas o gerente não acreditou. Em poucos minutos a Polícia estava no Banco.

    Levaram-me para uma sala fechada. Os cheques eram roubados. Demorei mais de 2 horas tentando explicar. Ficou o B.O em meu nome e disseram que eu seria alvo de investigação.

    Saí do banco e parei para comer um hot-dog. Estava faminto e havia sido taxado de bandido.

    Sou impoluto.

    Vou processar esses policiais e ainda vou achar os canalhas que me passaram os ‘cheques borrachudos’.

    Vou contar tudo para mamãe; ela sabe o que fazer.

    Voltei ao escritório. A tarde fora encurtada pelos problemas com os cheques. Depois de duas horas fechei o escritório e fui até o Bar do Português, onde tomei umas biritas. Havia tido uma ideia. Iria ao Hospital à noite, quando é mais sossegado e tiraria informações sobre a enfermeira que deixara meu coração em pedaços.

    Permaneci mais algum tempo, e entre umas e outras conheci uma figura nova no boteco. “Chico Teta” ele dizia. Havia chegado da Paraíba. Figura simpática e boa de papo. A conversa se estendeu e eu, claro, fiquei ‘beudinho da silva’.

    Meu amor deveria esperar até amanhã. O amor é lindo. Eu amo amar. Puxa vida, pensei com meus botões enquanto estava no ‘buzão’ como uma sardinha enlatada. Deveríamos pôr os políticos que só andam de carrões à custa do dinheiro público uma semana pegando ônibus para eles sentirem na pele o que é estar sentado com um homem a sua frente o braço segurando no ‘puta-que-pariu’ e fedendo sovaco.

    É demais pra mim.

    Sou uma pessoa sensível.

    Dormi desajeitadamente e tive pesadelos.

    Odeio pesadelos.

    Pela manhã, pontualmente às 10 horas estava de pé tomado banho e com meu melhor terno. Ou melhor, meu único terno. Pelas minhas contas levaria quase uma hora para chegar ao hospital. Iria pôr meu plano em ação.

    O início de meu grande amor: A enfermeira!

    Duas horas depois.

    Estava deprimido.

    Estivera no Hospital. Cara a cara falei com a enfermeira.

    Minutos de alegria e desespero.

    Ela sentiu pena de mim. Estava na cara dela quando me disse que era noiva de um homem.

    Não resisti e caí num choro convulsivo. A primeira mulher que realmente sentia eu que amava. Ela estava com os preparativos para o casamento.

    Seu nome?

    Nunca vou contar a vocês. Somente que seu noivo era pedreiro e se chamava Amável Pinto.

    Puta que pariu. Àquilo me partiu o coração e desatei a chorar ainda mais e mais e mais e não sei quanto mais.

    Pinto!

    Grande Pinto!

    Homem de sorte!

    Ela era linda meiga e virtuosa. Estava se guardando para o casamento.

    Fui embora arrasado.

    Não voltei ao escritório. Fui direto para o boteco da Gertrudes. O sol ainda ardia forte e tomei umas cervejas. Quando escureceu, meu amigo Herculano apareceu e ouviu minhas lamúrias pacientemente. Quer dizer paguei a ele 50 pilas. Não contem para ninguém, mas Herculano é traveco. Traveco mas é meu amigo.

    Quando a Lua estrondava seu esplendor, Herculano subiu num importado. Iria trabalhar. Vida dura, mas ele cobra caro.

    Chico Teta que aparecera, de repente, ficou comigo.

    Bebemos.

    Chorei mais uma vez em seus ombros o amor perdido. Estava fadado a perambular pelo mundo solitariamente.

    Por volta das 9 da noite adentrou ao respeitoso Forró da Gertrudes uma mulher loira.

    Ela me olhou sorriu e veio em minha direção.

    “Senhor Tango?”

    “Sim. Em carne e poucos ossos, ou o que sobrou deles”.

    Ela sorriu. Lábios lindos, grossos e carnudos. Era uma Angelina Jolie. Fitando-me disse sensualmente.

    “Fui ao seu escritório, entretanto o senhor não estava lá. Informaram-me que o encontraria aqui. Aqui está meu cartão. Por favor, me ligue pela manhã.”

    Sorri e assenti. Olhei-a saindo de ‘cabo a rabo’. Fenomenal.

    Aquilo não era uma loira com um par de tetas excepcionais. Mas acredito que as tetas eram ‘compradas’.

    Ela se afastou, olhou para trás e piscou.

    Meu telefone tocou.

    De repente tive uma ideia sensacional e olhei para o Teta e chorei.

    Não me lembro de como cheguei em casa. Mamãe estava dormindo e eu de ‘fogo’. Dormi de roupas. Sonhei com a enfermeira. Um pesadelo. Como vocês sabem, odeio pesadelos. Ela tinha a cara do Freddy Krueger. Foi terrível. Quando acordei, olhei o relógio.

    Dez horas da manhã.

    Sou um cara pontual.

    Lembrei-me da Angelina Jolie e sorri.

    Tango, Afrânio Tango, detetive particular. Recém-desencantado com o amor.

    André Guazzelli.

     

     

     

     

     

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